quinta-feira, 31 de maio de 2012

Panamá além do canal

Após fazer as contas dos gastos para atravessar o vazio que há entre a Colômbia e o Panamá, acabei decidindo cruzar esse trecho pelo jeito mais barato e, claro, mais difícil. Fui pegando barquinhos pequenos, como este da foto, de povoado em povoado na região de Darien, província do Panamá em que não há estradas, só mata e algumas vilas na costa. Foram quatro dias (dois deles sem banho de água doce) em que eu e a moto fomos levados por quatro barcos.

O termino da parte terrestre foi em Turbo, no norte da Colômbia, que é uma cidadezinha bem feia, com águas bem poluídas. A partir daí, a moto seguiu em um barco que leva bananas para Puerto Abaldia, já no lado panamenho. Como o barco não leva passageiros, eu tive de tomar dois barquinhos de fibra, como esse da foto também, que vão em alta velocidade, sacudindo e batendo nas ondas. Não parece, mas após três horas de viagem, você está quebrado. Depois, foram dois dias em Puerto Abaldia, esperando o barco de bananas e implorando para algum dono desses barquinhos levar a moto até Carti, onde começa a estrada do lado panamenho.

Essa última pernada levou oito horas e foi a mais cara (US$ 200 pela moto e mais US$ 100 para o mesmo barquinho me levar). E eu ainda tive de arranjar mais seis passageiros, pagando US$ 100 cada um, para que o barqueiro quisesse sair. Ao todo, de Cartagena, na Colômbia, à cidade do Panamá a travessia saiu por US$ 600. A opção de colocar a moto em um navio cargueiro custaria bem mais (US$ 900, pelo navio com as taxas portuárias, e mais a minha passagem de avião, por quase US$ 300, ou de veleiro, por cerca de US$ 500). Os preços da travessia aumentaram bastante depois que a Capitania dos Portos colombiana proibiu os veleiros de levarem motos.

Depois disso tudo, tive de descansar dois dias nessa ilha aí da foto, que fica no arquipélago de San Blás, um território controlado pelos índios Kuna Yala, no litoral caribenho do Panamá. A água é realmente incrível, morna e cristalina. A ilha em que fiquei se chama Iguana (foto acima) e tem apenas quatro cabanas de bambu e palha, bem simples, que hospedam turistas que não estão pensando muito em conforto, apenas tranquilidade. E foi o que tive.

Além do mar transparente, o Panamá tem grande parte do seu território com florestas tropicais bem preservadas, o que torna o país um grande destino para o ecoturismo. O que não vi muita graça foi na capital (foto acima), que é conhecida como a Miami da América Central, com toda razão. O bairro histórico de Casco Viejo, onde estou hospedado, tem algum casario colonial, mas ainda está sendo recuperado depois de anos de degradação. A visita ao canal para ver os navios cargueiros passando pelas eclusas é outro programa que vale a pena. Bom, hoje ainda estou na cidade do Panamá e amanhã sigo rumo ao noroeste do país e devo dormir em alguma praia no caminho para a Costa Rica.

Beijos e abraços,
Claudio de Souza.

domingo, 20 de maio de 2012

Colômbia: esta és mi tierra

Nesses 20 dias desde que saí do Equador, a Colômbia me conquistou. A exuberância verde de suas montanhas e a diversidade de clima logo me chamaram a atenção nos primeiros quilômetros pós-fronteira. Em algumas horas, todo o cenáro muda. As estradas vão a mais de 3 mil metros de altitude (como esta da primeira foto), com 10 graus de temperatura, e logo depois ao nível do mar, "mostrando um país tropical", com um calor de quase 40 graus. Até a comida e o sotaque do povo muda em uma distância surpreendentemente curta.

Logo após a primeira noite aqui, que foi numa cidade não muito aprazível, chamada Pasto, no primero café da manhã na estrada, perguntei o que havia de café da manhã. A resposta: carne, ovo mexido ou frango, com arroz e batatas fritas. Tem pão? Perguntei. Não. Disse a atendente do restarante às 9h da manhã com cara de espanto para uma pergunta tão estúpida. No dia seguinte, já estava em Cali, onde comer pão (com ovo também, claro) e café, no café da manhã, já é uma coisa normal.

A guerrilha, logo lembrada quando se houve o nome do país, não chegou a me preocupar em nenhum ponto das rodovias, que são extremamente vigiadas pelo Exército e pela Polícia Nacional. Rodei quase 3 mil quilômetros, cortando a Colômbia da fronteira com o Equador, no sudoeste do país, até a costa do Caribe, em Cartagena, onde estou agora, e todo o tempo vi muitos soldados patrulhando a estrada, principalmente no trecho até Cali, que fica mais próxima da costa do pacífico (esse ônibus acima é típico em toda a Colômbia).

Até agora, enquanto estive aqui, houve dois episódios que trouxeram a guerrilha para as primeiras páginas dos jornais, que foram o sequestro do jornalista francês e o atentado ao ex-ministro do governo Uribe em Bogotá. No primeiro caso, o jornalista estava cobrindo um combate entre forças do governo e da guerrilha quando foi capturado. Então, não é uma onda de sequestros fora das "áreas de conflito". No segundo episódio, apesar de eu ter passado pelo local da explosão umas duas horas antes, saindo da capital rumo a Medellín, acho que a probabilidade de ser atingido pela explosão é quase igual a de se ferir com um bueiro da Light no Rio.

Nas livrarias, o que mais vi são livros sobre o tema. E nas conversas entre viajantes, a guerrilha também é sempre mencionada. Mas em conversa com os colombianos, sempre que pergunto sobre o tema, noto que as pessoas desviam do assunto. E não é por medo. Acho que é mesmo porque já estão de saco cheio de serem perguntadas e de serem tão conhecidas pelo problema.

Além das forças armadas, as montanhas e a chuva (ela de novo, pelo menos uma horinha por dia) me acompanharam todo o tempo nas estradas, fazendo com que viagens de 400 km demorassem quase 10 horas. As montanhas ficaram para trás pouco antes de Cartagena, mas as chuvas não, tornando-se torrenciais todas as noites (a primeira me pegou a pouco mais de 10 km de Cartagena para dar as boas-vindas). Se você está a salvo é até bom para aliviar o calor de quase 40 graus, mas essa noite a hospedaria em que estou não me deixou tão a salvo assim e uma cascata caiu sobre minha cabeça às 4h da manhã, molhando tudo e me obrigando a mudar de quarto no meio da madrugada.

Além do campo e das florestas daqui, as três maiores cidades colombianas também me conquistaram. Bogotá, Cali e Medellín, cada uma tem sua peculiaridade e seu charme. Bogotá (a foto acima é da Praça Bolivar, no centro de Bogotá) foi a cidade de que mais gostei e em que mais tempo fiquei: uma semana. O suficiente para esmiuçar cada quarteirão da Candelária, bairro antigo ao lado do centro e onde fica a maior parte das hospedagens de mochileiros e dos prédios históricos. A beleza do casario colonial e de prédios de séculos atrás, a beira de montanhas verdes como as do Rio de Janeiro, dão um toque especial ao lugar. O porém é o número imenso de pedintes nas ruas. Que pena. Outro problema chega à noite. A chapa é quente e soube de pelo menos dois roubos a turistas que estavam no abergue em que me hospedei.

Bom, mas voltando aos fatos positivos: a música. Desde que saí do Brasil, a Colômbia foi o primeiro país em que escutei música local que não fosse aquele folclore andino das flautinhas. Em todos os outros, o pior da música brasileira e internacional é a trilha sonora dominante. Na Colômbia, a salsa, a rumba dão o tom e ainda tem uma interação bem grande com as demais sonoridades caribenhas, com destaque para a música cubana.

Bom, agora estou buscando uma forma de atravessar o chamado Darien Gap, uma área coberta de floresta do sul do Panamá em que não há estradas ou qualquer caminho. Para meu azar, os veleiros que fazem a travessia de Cartagena (essa última foto é da Cidade Murada, parte mais antiga de Cartagena) ao Panamá foram proibidos recentemente de levar motos, como costumavam fazer há anos. Bom, as opções são complicadas. A primeira é esperar um navio cargueiro para mandar a moto e que pode demorar bastante e com preços salgados (800 dólatres pela moto mais a minha passagem de avião). A segunda é pegar três ou quatro pequenos barcos de pesca e carga que cruzam os trechos entre pequenos povoados que ficam isolados na costa do Darien Gap. Se eu não conseguir confirmar um navio até terça-feira, acho que vou tentar a segunda opção.

Abraços,
Claudio.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Cheguei à metade... do mundo

Essa semana passei dos 10 mil quilômetros rodados e ultrapassei a linha do Equador. Ainda não sei se é a metade do caminho, porque não sei ao certo a quilometragem que irei percorrer, mas já andei pra burro. Cruzei a fronteira do Peru com o Equador no domingo e, amanhã, já devo estar na Colômbia. Resolvi dar uma aceleradinha na viagem porque só no Peru fiquei um mês e, como não dá pra conhecer bem tudo, tenho de escolher alguns pontos. A Colômbia espero que seja um desses pontos.

Mas não é desdém com o país que marca a metade do mundo. O Equador vai muito além da linha. Logo que entrei aqui a paisagem mudou completamente depois dos milhares de quilômetros de deserto desde o Atacama, no norte do Chile, até o norte do Peru. O clima virou tropical, com muito verde, plantações de banana, montanhas e vulcões. São mais de 30 no Equador, muitos ainda ativos.

Escolhi visitar um deles, o Quilotoa (esse aí da foto). O vulcão tem um lago de água verde na cratera e fica a 4 mil metros de altitude. O calor da planície equatoriana logo se foi quando comecei a subir as montanhas rumo ao centro do país e no vulcão o frio foi de lascar, com direito a chuva de gelo. Aliás, foi deixar o deserto peruano e a chuva voltou a me acompanhar.

Por causa dela, da chuva, tive de dormir de ontem para hoje na vila que fica à beira do Quilotoa porque estava todo molhado e não ia enfrentar a estrada naquele frio. Foi uma experiência "étnica", se posso assim chamá-la. Dormi numa pousada dos índios andinos, que só ficavam falando Quechua, e eu era o único hóspede, além de único não-índio a passar a noite no lugar. Acordei cedo e vim dormir numa cidade a três horas da fronteira colombiana, chamada Otavalo. Amanhã, Colômbia.

Desculpem por dar tão breves e espaçadas notícias, mas essa vida de viajante está muito corrida. Não durmo duas noites na mesma cidade desde que saí de Lima, no dia 26.

Abraços!